segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Salada de sonhos



Ele é predominantemente verde, mas com cores por todos os lados. Vermelho, laranja, roxo, amarelo e tantos outros tons entre dó e si. Vivo e pulsante, é possível sentir o chão adocicado vibrar sob os pés. É assim meu jardim de sonhos.

Lá planto esperanças para fazer a terra engravidar do futuro. Ela gesta em mim possibilidades e expectativas, cada uma com um sabor. São mangas, goiabas, amoras, caquis, jabuticabas, melancias e tangerinas.

Nem sempre a fruta nasce em seu próprio pé. Já aconteceu de nascer uva em macieira. Alguns sonhos não respeitam a lógica, transgridem as circunstâncias e nascem onde querem. Eles tocam a canção em F#m7/D#, sobre a falta de controle que pauta a vida de todos nós.

Aconteceu num fim de tarde, sem nenhum aviso. Colhi umas acerolas e, quando coloquei a primeira na boca, senti o estranho sabor amargo dominar o fundo da minha língua. Nem sempre a vida é doce.

Quando os dias amargam é preciso revisitar os passos dados na última plantação. Pode até ser que não tenha nada a ver com o processo utilizado ou com as sementes plantadas, às vezes as contingências são maiores e os acidentes inevitáveis. Contudo, na maior parte das histórias, o problema está mesmo nas sementes que foram lançadas.

Semeadas por um coração amargo, frutificam dias indigestos. Apesar do clichê, é verdade que quase sempre se colhe o que se plantou. Para que o pé de amigos fique carregado e colorido, é preciso plantar fidelidade, parceria e cumplicidade. Plantando mentiras e infidelidade, o que se obtém são amizades amarguradas.

Que fique claro para todos os jardineiros. Para que os sonhos façam sucos refrescantes é preciso cuidar das sementes. Para que a felicidade visite a ponta da língua, é preciso cuidar do pé de amor(as).

Vez por outra, contudo, a lógica se quebra. Como disse, às vezes colhemos o que não plantamos. Pode acontecer de plantarmos ódio e colhermos perdão, semearmos traição e colhermos fidelidade. Essa é uma das colheitas mais misteriosas que existem, porque rompem com todas as condições normais de temperatura e pressão. É a colheita da graça.

Ela não apenas desrespeita causa e efeito como transgride. A graça é sempre transgressora. Ela não apenas deixa de punir como deveria, como oferece um favor imerecido. Ela não investiga qual a semente plantada para frutificar compaixão. A compaixão é seu fruto incondicional.

Aconteceu no meu jardim. Enquanto passeava colhendo amarguras, enxerguei um pé de compaixão que não plantei. Tinha uma copa linda, que me fixou os olhos. Nela estavam frutos doces e carnudos. Deu-me de comer quando tive fome.  

A graça transgride e por isso incomoda. Ela não cobra sangue de quem fez sangrar. Um jardim feito só de lágrimas não atrai o olhar. Só quem deseja jardins coloridos é capaz de aceitar a transgressão da misericórdia e fazer da gratuidade uma rede para descansar sob o abacateiro.  

Lucas Lujan