Era uma conversa por telefone.
Amigo de longe, ser humano bonito. Duvidava de sua coragem para viver. Eu, ao contrário, o julgava forte e seguro. Admirável. Era sensível
e sabia tratar as pessoas com carinho.
Enquanto conversávamos, me
confundi várias vezes com ele. Enfrentávamos dramas, não semelhantes nas
circunstâncias, mas nas dores. Todos que sofrem, não importa o motivo, têm em comum a dor. Esse deveria ser um convite à solidariedade e à compaixão mas, egoístas, insistimos em sofrer sozinhos e ignorar o sofrimento alheio. Tão pequeno de nossa parte.
O remédio para o sofrimento não é deixar de sofrer, é ter com quem
reparti-lo. Não sofrer é uma impossibilidade, dividi-lo é
empreendimento do amor. Descobrir que alguém sente nossa ferida é o caminho para curá-la, porque a dor se dilui nos corações envolvidos. Quem tem companhia
anda pelo vale da sombra da morte sem temer.
Contava-me que pensara em
desistir da vida. Tão breve e frágil, muitas vezes perdia o sentido e nem
sempre era fácil reencontrá-lo. Divagava sobre todas as inseguranças e incertezas
da existência. Ele tinha razão, suas palavras me atingiam e encontravam em mim
cabimento.
Tantas vezes pensei em desistir.
Entregar-me à correnteza dos dessabores e me afogar no mar do esquecimento. Já
quis mesmo me esquecer de mim. Por isso fui honesto e disse a ele que muitas
vezes sentia o mesmo, e acreditava que todos, em algum momento, se
sentiriam assim. É a inevitável angústia de viver, o desespero humano que nos
visita hora ou outra. Legítimo.
Contei à ele sobre quando meu
pai deixou minha família. Enfrentamos dias difíceis e amargos. Muitas vezes
ouvi minha mãe chorar no banho, porque tentava nos proteger de seu sofrimento e
desespero. Falei que ela tinha motivos para desistir.
Mas não desistiu.
Para o desespero humano, um salto de fé. Minha mãe não sucumbiu porque tinha fé. Acreditava que a angústia e o
desespero não eram maiores que o amor; que os próximos dias seriam melhores,
porque a felicidade era possível. E de fato a vi feliz nos anos que se
seguiram.
Então passei a acreditar no
futuro também. Vi que ele traz motivos para
querer viver. E porque acredito, não desisto. O segredo é reunir forças nos dias bons para enfrentar os ruins.
A vida é bonita, mesmo quando faz careta. Falei para ele sobre as infinitas possibilidades que estaria perdendo e sobre todos os amores que não viveria se entregando. Falei dos amigos que não faria, da família que não teria e dos vinhos que não experimentaria.
A vida é tão boa que seduziu Deus. Entregue, se fez homem para vivê-la.
A vida é tão boa que seduziu Deus. Entregue, se fez homem para vivê-la.
Não se trata de ignorar as
dificuldades da vida, mas de dar o salto de fé e enfrentá-las com
bom ânimo.
Encerrei a conversa com uma
alegoria, que construí para nós dois:
“- Pense nas flores dentes-de-leão, amigo. Quando estão secas e o vento
sopra forte, se despedaçam e voam para longe. Ficam com a aparência destruída.
Mas são suas sementes que voam, e farão brotar mais dentes-de-leão noutros
lugares. O mesmo acontece com a gente. Quando o vento atinge com violência nos despedaça e destrói, mas nossos cacos logo encontram terreno fértil para
renascermos de maneiras novas e bonitas. Sempre que pensar em desistir, lembre
que os campos ficariam menos coloridos sem dentes-de-leão.”.
Lucas Lujan