Foi deitar depois de ter feito
algo que prometeu nunca mais fazer. Uma sensação de decepção o angustiava. A
cobrança por comportamentos indesejados, já vividos em outros momentos,
torturava contando mais uma vez a história que se repetiu. E mais uma, depois
mais outra, e então de novo.
Querendo lembrar para sempre o
tamanho de sua frustração, a fim de registrá-la perpetuamente na memória,
permitiu que a dor consumisse de vez. Talvez as marcas do sofrimento em seu
corpo servissem de lembrete para a próxima ocasião.
Questionava-se por sua memória
fraca. Culpava-se por ela. Não sabia se reincidência era uma marca universal da
humanidade ou uma fraqueza particular. Diante de tantos sentimentos confusos, questionava
sua própria capacidade de raciocinar.
Apressou-se em encontrar lápis, borracha e
papel, e começou a elencar suas experiências. Mergulhou em histórias que
revelavam um lado de si que detestava. A partir dessas vivências esperava tirar
lições para não se tornar definitivamente sua pior versão.
Uma lista de pequenos lembretes. Desejava
que fosse impressa em seu coração para ser consultada diante de toda situação
difícil. Assim, antes de tomar uma decisão, estaria resguardado de ser o pior
de si mesmo.
Começou anotando que pontos de
vista dependem do chão onde os pés pisam. Enquanto uns veem a alvorada, outros veem
o crepúsculo. Então, quando visse o Sol chegar, não deveria ignorar o ponto de
vista de quem o está vendo partir.
Anotou que não deve rejeitar as
pessoas por não corresponderem às suas expectativas. Quando Jesus perdoou Pedro,
ensinou a não culpar ninguém por ser menos que perfeito. Toda relação com pessoas não perfeitas é
imperfeita, por isso a importância de novas chances sob a reconciliação.
Continuou lembrando que o importante
não é vencer a batalha. Perder é inevitável, resta aprender com a derrota. Mais
importante é reunir coragem para lutar, porque não há vida sem batalhas. A
coragem vale mais que a vitória.
Remoendo suas injustiças,
escreveu que justo é quem escolhe praticar com o outro aquilo que deseja para
si. E que a justiça que não deriva do amor é vingança.
Os ciclos da vida se renovam,
rabiscou. A vida não é uma engrenagem viciada que gira sempre em torno do mesmo
eixo. O choro pode durar uma noite inteira, mas a alegria vem pela manhã. Toda
nuvem nebulosa se dissipa e é questão de tempo para o Sol voltar a brilhar. Até
que novas nuvens apareçam, escondam o Sol e o ciclo se renove.
Ninguém sofre sempre, nem
tampouco sempre se alegra. Não acredite que só há tristeza ou só há felicidade,
sublinhou. A vida é tecida entre lágrimas e sorrisos. Por isso, vive bem aquele
que sabe acolher a felicidade e a dor. Em outras palavras, feliz é quem sabe sorrir
quando se alegrar é preciso, e chorar quando é necessário sofrer.
Ficar triste é motivo de pelo menos
uma alegria: a de não ter se tornado insensível. A tristeza revela que ainda
existem coisas e pessoas importantes, capazes de fazer sofrer. É melhor a
tristeza que a insensibilidade. É melhor sentir dor que não sentir nada.
Finalmente, sua última anotação
antes de se entregar à Morpheu. No caso de todos os outros lembretes serem
esquecidos ou ignorados, esse estaria sempre presente como cláusula pétrea,
pois poderia recuperar sua vida:
"Porque sou errante, perdoo. Porque sou imperfeito, não espero
perfeição. Porque sou falho dou segundas, terceiras e quartas chances. Porque
sou fraco, me identifico com quem chora. Porque repito erros que jurei nunca
mais cometer, não culpo os reincidentes. Porque sou humano, não espero que meus
semelhantes sejam deuses.".
Lucas Lujan
Acreditar que a vida segue e algo em nós sempre muda é deveras necessário. Texto inspirador! Anotado!
ResponderExcluir:)
ExcluirObrigado! Que bom que gostou.
A vida sempre segue, de um jeito ou de outro. Então, que seja do melhor.
Acho que acaba sendo "óbvio" carregar na bagagem algumas tristezas... Um lembrete de que de fato, não somos feitos só de coisas boas... E é exatamente isso que nos humaniza
ResponderExcluir"(...) Por isso, vive bem aquele que sabe acolher a felicidade e a dor ..." - Inspirador e genial!!!!!!
Oi, Luciana!
ResponderExcluirO que nos torna humanos é o fato de nascermos inacabdos. No processo de nos construir, as tristezas são inevitáveis.
Beijo
Fala querido Lucas,
ResponderExcluirCreio que expor, quando necessário, nossas fraquezas, ser honestos conosco e sentir a dor do erro sem se torturar, é o caminho para a cura e forças no enfrentamento das batalhas da vida.
Obrigado pelo texto e pela coragem.
Abraços.
:)
ExcluirAbraço, primo!