quarta-feira, 26 de março de 2014

Fé no porvir



A vida humana é transitória e precária. Nela, nada é definitivo. As coisas estão sempre mudando, se reinventando. Nada que vive é permanente. Nenhum paradigma dura para sempre.

Tudo nasce e morre, renasce e morre novamente. Assim sendo, a fé também precisa morrer para poder nascer de novo. Uma fé que não morre não abre espaço para geração de vida nova.

A ressurreição de Jesus aponta exatamente para essa realidade: todo tipo de vida morre para poder renascer. Sem túmulo não há ressurreição.

Uma fé que não morre deixa de ser fé e passa a ser convicção: prisão dos tolos que pretendem perpetuar a verdade transitória de cada geração. Uma fé que não morre vira certeza e sufoca a fé, porque a certeza não precisa de fé.

Com isso não pretendo uma fé líquida. Ao contrário, a única fé sólida é a que sabe morrer para ressuscitar.
  
Não nego, a morte é dolorida e desestabilizadora. Ela coloca o mundo em desordem. Foi assim com os discípulos de Jesus, por exemplo. Quando o Mestre morreu tudo virou pó e se desencantou. Foram dias de puro caos. Mas é exatamente do “sem forma e vazio” que nascem as coisas, ensina a fé judaico-cristã.

O encontro com o Jesus Ressurreto ressuscitou a fé de seus discípulos.  Recém-nascida, se preparou para o mundo refeito, revisado e reformulado. Só pode viver num mundo sempre novo a fé que se renova sempre. 

A morte de Jesus ensina: não se iluda com a ideia do “para sempre”. Para a vida continuar é preciso morrer. Uma fé que vive para sempre não é fé, mas ilusão.

Claro, para lidar com essa realidade é preciso ter coragem de perder o chão por alguns dias. Muitos não têm, e preferem se iludir com a perpetuação de uma fé que já não tem conexão com a realidade, mas que pelo menos continua a fornecer um chão.

Mas alguns têm coragem. Alguns permitem que a fé morra, na esperança da ressurreição para o novo. Essa é a única atitude para quem quer uma fé ligada com a realidade. Só uma fé transitória e precária pode se conectar com uma vida e um mundo transitórios e precários.

Fé não é acreditar sempre na mesma coisa, isso é ingenuidade. Fé é apostar que a morte é apenas o anúncio da vida que está por vir.


Lucas Lujan

4 comentários:

  1. Bem dito, Lucas. Assim como nós passamos por transformações, nossa fé também precisa passar. Ela necessita de páscoas constantes. Mortes e ressurreições ao longo da nossa caminhada.

    ResponderExcluir
  2. Genial! Tenho a impressão que em muitos momentos temos que ser uma fênix de nós mesmos e da nossa fé!! Reinvenções.....

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. :)

      Tenho a mesma impressão. Às vezes precisamos deixar morrer o que nos desumanizou para sermos humanos novamente.

      Excluir