sexta-feira, 23 de maio de 2014

Fome de vida


Massas pré-assadas em forma de bolinhas, organizadas em assadeiras. Ingredientes caprichosamente separados, prontos para o trabalho: queijos, calabresas, tomates, azeitonas, cebolas, ervilhas, manjericão, brócolis, rúculas, berinjelas. Forno aceso, temperatura ideal. Estava tudo pronto para a pizzaria abrir.

Essa era a rotina na pizzaria do meu tio, que acompanhei algumas vezes. Eu adorava. Durante todo o período de trabalho eu sentia fome. Não importava o quanto havia comido, queria sempre mais. Aquele cheiro de pizza assando era mais sedutor que o bom senso do meu apetite.

Era uma pizzaria familiar. O pizzaiolo, outro tio. Eu o assistia com admiração enquanto preparava uma pizza. Ele caprichava. Abria a massa com força e determinação, depois espalhava o molho de tomate e então recheava. Sem economizar. Ver o processo era saboroso.

Uma vez, já no fim da noite, ele perguntou se eu queria preparar minha própria pizza. Eu flutuei de alegria por uns dez segundos até ele agarrar minhas pernas e me devolver ao chão. Se eu queria? Não tinha nada que queria mais! Depois de vê-lo tantas vezes em ação, finalmente poderia imitá-lo.

Ele foi o maestro me ensinando as primeiras notas. Fazia o movimento e eu repetia. Primeiro abriu sua massa, e abri a minha. Passou o molho de tomate, fiz o mesmo em seguida. Na hora do recheio, disse que eu teria que fazer esse movimento sozinho. Pediu-me para imaginar a pizza mais deliciosa do mundo e então inventá-la. Podia colocar o que quisesse, porque eu era o dono daquela pizza.

Aquela noite marcou meu jeito de ver o mundo. Entendi o motivo de Deus ter criado o universo e depois tê-lo entregue em nossas mãos. Ele é o pizzaiolo. Fez tudo do melhor jeito para nos ensinar a fazer nossa própria pizza. Deixou a massa e os ingredientes para usarmos segundo nossos desejos na criação de nosso mundo.

Para criar pizzas, pizzaiolos usam farinha e fermento.

Para criar o mundo, Deus usou a beleza. Ensinou, assim, de onde devemos partir para criar os nossos.

Cada um de nós tem um universo pessoal. Somos responsáveis por criá-lo. O caminho é imaginar o mais belo de todos e então inventá-lo, usando os ingredientes preferidos.

Somos os donos de nossos mundos. Quanto mais beleza colocarmos nele, mais fome de beleza teremos. O cheiro da beleza assando no forno sempre abre o apetite. De uma vida bonita, sempre se quer mais. 

Lucas Lujan

11 comentários:

  1. Que jeito gostoso de escrever... e de ver a beleza do mundo!!! Isso devolve a alma da gente, ou seja, anima a gente a querer fazer sempre mais belo e mais gostoso!!! Vou compartilhar seu blog!!! Obrigada...

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    1. Obrigado por compartilhar!

      Que bom que gostou, fico feliz. Apareça sempre!

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  2. Que lindoooooooooooooo !!! adorei vontade de ficar aqui a noite toda Parabéns

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  3. Como eu gosto desses seus textos sensoriais, onde a cada palavra, consigo sentir diversos cheiros e sabores ;D essa sim é a vida que eu acredito e quero viver. Falo exatamente a mesma coisa no meu último texto, mas usei o cinema como plano de fundo. Roteiristas ou Pizzaiolos, espero que possamos construir uma vida simples e leve, cheia dessas cores, formas e gostos. Parabéns, o texto está ótimo como sempre.

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    1. Obrigado por ter vindo até aqui ler, amigo. Fico feliz em saber que gostou do texto. Tenho acompanhado o seu blog tb e gostado muito! Gosto das provocações que faz, continue.

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