quinta-feira, 2 de maio de 2013

Deus fala



Deus sempre falou com a humanidade. Falou na história, por meio da história. E acredito que Ele ainda fala.

Eu o ouço. Não se espante, não fiquei louco. O que aconteceu é que passei a ouvir com mais atenção. Treinei meus ouvidos. Ajustei minha interpretação. Procurei o caminho da sensibilidade e do amor.

O ouço na risada do bebê que brinca com a comida; na gritaria das crianças que correm no parque; às vezes sua voz tem tom feminino, de mãe aconselhando filho, outras, tom masculino, de pai fazendo piada pra ver a filha sorrir.

O escuto no lamento diante do acidente; no silêncio desesperado do marido que perde a esposa prematuramente; no grito agudo da mulher que é abusada; no choro de fome das crianças do sertão; no sussurro envergonhado de quem é excluído; nas palavras desamparadas de quem não tem onde dormir ou o que vestir; muitas vezes sua voz é rouca por causa de sua garganta sedenta.

Ouço Deus nas palavras das hospitaleiras que recebem pessoas em casa, servem comida à vontade e cedem a cama; ouço Deus pela voz do professor que luta para educar; nos lábios de quem reage contra a injustiça; nas palavras apressadas do médico para que a vida não se vá; sua voz é nítida e forte saída da boca do bombeiro que orienta buscas no morro soterrado.

Ouço sua angustia diante das absurdas injustiças sociais, de toda opressão econômica e política; ouço seu protesto na voz de quem se sente desrespeitado em campanhas eleitorais; sua voz é fraca nos lábios de quem foi humilhado, mas forte quando emitida por quem quer dignidade.

Já ouvi sua voz serena conceder paz e perdão ao errante; já escutei suas palavras misericordiosas ditas ao culpado; ouço-o nas palavras de quem não perde a esperança diante do caos; na confiança de quem acredita no amor; no trincar de dentes do menino soldado que teve sua infância roubada, mas que não desiste da vida.

Sua voz é afinada no canto da faxineira que levanta de madrugada para sustentar os filhos; é empoeirada no pedreiro que não almoça para poder jantar; é molhada na boca da lavadeira que alimenta o pai doente; é amarga na boca de quem tem amor ausente.

Voz de justiça nos lábios do juiz íntegro, do advogado responsável; voz de igualdade social emitida pelo banqueiro dos pobres; voz profética na boca do padre que denuncia a indiferença, na boca o pastor que aponta a corrupção.

Ouço-o na beleza das palavras do poeta; na música do compositor apaixonado; nas mãos de instrumentistas habilidosos; nas páginas dos escritores vislumbrados com o mundo; na arte de quem reverencia a vida humana.  

Sua voz nunca tem tom de poder, de autoritarismo, de imposição. Ao contrário, o ouço na fraqueza do nazareno crucificado.

Deus se revela pela Palavra. Palavra encarnada, jogada na vida, mundana. Por isso é possível ouvi-lo.

A questão, então, não é se Deus fala; é quem está disposto a ouvi-lo.

Lucas Lujan

7 comentários:

  1. Sim, é possível também ouvi-lo em suas palavras. A graça manifestada em poesia me alcançou nesta leitura. Obrigado querido!

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  2. Oi, Gleidson. Obrigado pela leitura e pela visita, amigo. Fico feliz em ter te alcançado. Um abraço, amigo.

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  3. Lindo texto Lucas!!! Obrigado pela narrativa e caminhos. Abx

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  4. Lucas, você escreve lindamente! Abraços.

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  5. Obrigado lucas por proporcionar refrigério com a tua escrita.

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  6. Tomei a liberdade de postar seu poema,que Deus possa te dar muitas inspirações.

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